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terça-feira, 8 de março de 2016

A batalha pelo legítimo direito de fazer parte da Geração “NoMo”

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Muitas mulheres ainda precisam enfrentar o preconceito, inclusive da família, para assumir o fato de não querer ser mãe
A batalha pelo legítimo direito de fazer parte da Geração “NoMo”
Priscilla tem apoio do marido para não ceder à pressão social de ter filhos (Foto: Arquivo pessoal )
SÃO LUÍS - Algumas conquistas femininas não têm a ver com leis ou políticas públicas, mas com a quebra de alguns padrões socialmente estabelecidos. Houve um tempo em que a mulher sentia-se pressionada a ser mãe, como se apenas cumprindo este papel ela pudesse se sentir realizada. Graças à coragem que muitas mulheres tiveram de questionar esses padrões estabelecidos, hoje em dia as integrantes da chamada Geração NoMo (No Mother) já conseguem se sentir mais livres para expressar quem são e o que querem de verdade.
Os preconceitos e a pressão – principalmente familiar – ainda existem, mas as NoMos conseguem se esquivar das piadinhas, perguntas indiscretas e olhares tortos. Independentemente dos motivos, o fato é que essas mulheres não se sentem – e não são – menos mulheres do que todas as outras.
Aos 33 anos, a estudante de Psicologia Elayne Quitanilha afirma que nunca foi seu sonho ser mãe, embora a ideia de adotar uma criança tenha passado algumas vezes por sua cabeça. “Às vezes eu considero a possibilidade de ser mãe. Mas coloco todos os prós e contras. A família pergunta, mas não me pressiona. Alguns amigos, quando eu digo que provavelmente não terei filhos, se assustam. Mas ninguém tenta me convencer do contrário”, afirma. Mas o fato de ter outras amigas que fizeram a mesma escolha deixou Elayne mais à vontade para falar abertamente sobre o assunto. “Antes eu era mais reservada quanto a isso. Não falava muito abertamente, até pelo que os outros diriam. Mas, hoje, já coloco isso de forma mais tranquila. Até porque algumas amigas minhas já expressaram também essa opção de não serem mães”, conta.
Elayne Quintanilha ressalta que a opção por não ser mãe não tem nada a ver com gostar ou não de crianças. “Tenho uma sobrinha/afilhada de 11 meses por quem sou apaixonada. Se um dia eu precisasse assumir a criação dela, não pensaria duas vezes. Historicamente, somos ensinadas que as mulheres possuem ‘instinto materno’. Como se só pudéssemos nos realizar se assumirmos nossa ‘missão de ser mãe’”, enfatiza.
E, de fato, Elayne não está sozinha na sua escolha por não ser mãe. A relações públicas Priscilla Costa tem 34 anos e afirma construir cada vez mais a certeza de não querer ter filhos. “Quanto mais a idade chega para mim, vou construindo mais essa certeza. Claro, que toda mulher tem dúvidas, e, quando a idade avança, ou seja, você passa dos 30, os círculos que você vive passam a te pressionar, com uma piadinha aqui, outra acolá, do tipo, ‘quando vai ter um filho?’ ‘Quando vai casar?’ ‘Ah, você vai se sentir realmente uma mulher completa quando for mãe’ etc. Podem parecer perguntas bobas, mas no fundo te pressionam e te fazem pensar sobre”, admite.
Apoio em casa
Priscilla tem no marido o apoio que precisa para não ceder à pressão social de ter filhos, mas, ainda assim, lamenta pela situação de sua mãe. “Posso dizer que, até agora, sou uma mulher realizada, e o fato de não ter filhos e não querer tê-los não me torna menos mulher, menos amada, menos profissional. Minha mãe já vem tentando entender isso, já vê que não quero ter filhos. Às vezes é um pouco dolorido pra mim ver ela nessa situação, porque sou filha única, então, consequentemente não terá netos. Mas, penso, sou eu que sou feliz assim e não tenho que ter filhos por causa disso”, destaca.
Cursando Doutorado em Ciências da Comunicação na Universidade de Coimbra, em Portugal, Tatiana Gonçalves confessa que já chegou a pensar em ser mãe, mas logo essa vontade passou. “Hoje, eu tenho 35 anos e vejo que, quando você consegue ‘agarrar a vida com as mãos’, quando você é dono do seu destino, as coisas mudam um pouco. No meu caso, a maternidade não se tornou uma prioridade na minha vida”, afirma.
E ela admite que “bancar” essa escolha não é fácil, pois ainda sente-se discriminada quando fala abertamente sobre o fato de não querer ter filhos. “Eu me sinto muito discriminada. Muito!! Seja pelas garotas da minha idade, seja pelas pessoas mais velhas. Parece que você comete um crime por simplesmente não tem muita vontade de ser mãe. Vejo que as pessoas pensam, de uma forma geral, mais ou menos assim: tem que crescer, ir ao colégio, entrar na universidade, arrumar um trabalho, casar e ter filhos. Se você foge a esse padrão, parece que está cometendo um crime, pecado, sei lá! Quando penso que a sociedade evolui e vejo essa atitude ou escuto comentários, muitas vezes das próprias mulheres, não sei, não consigo entender, não entra na minha cabeça”, avalia.
Tatiana Gonçalves afirma que está satisfeita com o rumo da sua vida e não pensa em ter filhos (Foto: Arquivo pessoal )
Satisfeita com os rumos de sua vida, Tatiana Gonçalves consegue lidar bem com a pressão das pessoas quando o assunto é maternidade. “Não me importo muito. Passei por uma situação engraçada um dia desses. Falei para uma senhora que não tinha muita vontade de ser mãe, que preferia viver a minha vida e que estava muito contente assim e ela me disse que eu já era velha demais e que meu tempo estava se esgotando e mandou eu procurar congelar os meus óvulos o quanto antes!! (risos). No fundo, eu até entendo a preocupação dela, mas tento ser fiel a mim mesma e respeitar as minhas vontades. Então, quando alguém faz um certo tipo de pressão com relação a isso, eu simplesmente ignoro”, garante.
Cercada durante muito tempo por crianças e adolescentes, por trabalhar em escola, a pedagoga aposentada Dulce Irene Martins decidiu desde muito cedo que não queria ter filhos e nunca se arrependeu de sua escolha. “Lembro que, aos 14 anos, assisti a uma matéria no Fantástico em que os filhos abandonavam os país no asilo e isso me marcou muito em ver a ingratidão dos mesmos com aqueles que tudo fizeram por eles. Não casei e, como trabalhava com crianças e adolescentes, sem falar nos sobrinhos e afilhados, adotei-os como filhos. Não senti discriminação e sim um reconhecimento no exercício da profissão de muitos alunos que me tiveram como ‘uma mãe’”, afirma.

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